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segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

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O princípio da incerteza

O professor virou-se e viu que a Sandrinha não estava escrevendo. Todos na aula copiavam o que o professor tinha escrito no quadro-negro, menos a Sandrinha. A Sandrinha estava dobrando e alisando um pedaço de papel.
– Dona Sandra, o que a senhora está fazendo? – perguntou o professor.
– Um aviãozinho, professor.
– Dona Sandra, eu pedi para copiarem o que eu estou escrevendo no quadro-negro sobre a teoria da incerteza de Heisenberg.
– Eu sei, professor. Mas eu estou preparando uma experiência prática sobre o mesmo assunto.
– Nossa aula hoje é sobre física quântica, dona Sandra.
– A minha experiência também.
O professor tinha desenvolvido uma tática para lidar com a Sandrinha. Para não explodir, contava até três. Desta vez contou até seis. Depois perguntou:
– E que a sua experiência tem a ver com o princípio da incerteza de Heisenberg, dona Sandra?
– Quando o aviãozinho ficar pronto, vou atirar para o alto, sem saber onde ele vai cair. Se bater em alguém, ou cair próximo de alguém, é a pessoa que eu vou namorar neste trimestre.
Por um momento, o único ruído ouvido na sala foi o do riso abafado. Desta vez, pensaram todos, a Sandrinha conseguiria. O professor perderia o controle.
Atiraria a Sandrinha pela janela. Ou ele se atiraria pela janela. De qualquer maneira, haveria uma explosão. Mas o professor manteve o controle, depois de contar até dez.
– E se cair perto de uma pessoa do sexo feminino, dona Sandra?
– Não tenho preconceito, professor.
– Só não entendi o que seu aviãozinho tem a ver com a teoria de Heisenberg.
– A incerteza. Ninguém sabe onde ele vai cair.
– Não, dona Sandra. É muito mais complexo do que isso. É...
– A teoria não diz que a ação humana interfere na observação das partículas subatômicas? Que por isso a medição dos seus movimentos é sempre incerta? Pois eu posso direcionar meu aviãozinho para um lado que me interessa. Ele vai dar voltas no ar, mas sua trajetória não será inteiramente aleatória. Minha vontade vai influir no seu destino. Pronto. Uma aula prática, professor.
O professor fechou os olhos. Um, dois, três, quatro...
– Faça o que quiser, dona Sandra. Vou continuar dando a minha aula.
Voltou para o quadro-negro e continuou a escrever. Dali a pouco, ouviu uma agitação às suas costas. O aviãozinho da Sandrinha tinha decolado. Virou-se a tempo de receber o aviãozinho no peito. E ouvir a voz da Sandrinha:
– O senhor é casado, professor?

Luís Fernando Veríssimo, no Zero Hora de ontem

thunder

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