Ao acordar, resolvi assistir à televisão local. O primeiro assunto, iniquidade social, mostra um homem que vive do lixo jogado no rio Tietê (famoso por sua poluição) e em seguida foca as prateleiras vazias do barraco em que vive. "Os filhos dele não vão comer hoje à noite", entoa o repórter, sentenciosamente. O próximo assunto do noticiário começa com as palavras: "O que fazer se seu filho come demais?". Basta trocar este pirralho pelas crianças da reportagem anterior, pensei com irritação.
O parágrafo anterior, roubado da revista piauí, é de uma matéria-diário de um inglês viajando pelo Brasil e mostra explicitamente o modo de se fazer jornalismo, ao menos nos padrões brasileiros (em especial da globo). O noticiário é feito de maneira oscilante, mostra-se uma notícia ruim e em seguida uma boa, que às vezes chega a ser "idiota" de tão boazinha, como aquelas de gaveta, guardadas para quando não se tem mais nada para mostrar, ou para épocas em que notícias padrão vão ao ar - sim, o natal e a temporada de verão estão nesse grupo.
Ontem aconteceu um exemplo típico. No fantástico, estereótipo do programa para a família, passaram uma matéria sobre o resgate de uma brasileira soterrada após o terremoto no Haiti. Drama e emoção, além é claro do sentimento de humanidade. Para a reportagem seguinte, um passeio pelas regiões que não foram atigidas pela catástrofe, para revelar o que há (e havia) de melhor no país, em um clima que não lembrava em nada o anterior.
Logicamente, o jornalismo não pode ser um desfile de desgraças, tem que existir espaço para o entretenimento, até porque a maior parte dos telespectadores assiste tv para desligar o cérebro (e não vejo problema algum nisso). Mas um noticiário não é, idealmente, espaço para conformismo, e sim de mudança e exposição de problemas.
Bernardo Staut